domingo, 6 de agosto de 2017

VERGONHA PARA SEMPRE


Quando pensamos em Bill Clinton, por exemplo, as nódoas que imediatamente nos salpicam a memória não são as do seu currículo como Presidente, em que cumpriu, até, mandatos, no mínimo sensatos. Todavia, por causa dessas apolíticas nódoas, "sensatez" dificilmente será o adjectivo a figurar ao lado do seu nome, num livro de História.

Já que usamos o pesado termo História, detenhamo-nos no caso português. Que políticos portugueses contemporâneos ganharam um lugar cativo na nossa memória colectiva? Antes de me atirarem, em registo simplista, com os Sá-Carmeiros, os Soares e os Cunhais, previno-vos que me baseio em estudos sérios. A resposta correcta seria: Sócrates e Relvas.

A tese é que o embaraço público (a vergonha perante o mundo), tem, em suma,  mais eficácia sobre a memória, do que os actos meritórios. Poderei não ser esquecido como bom professor. Mas alguém duvida  de que a imagem indelével na memória dos alunos, "não te recordas, pá? ahahaha", será a da stora que, numa aula, entrou grotescamente em disputa com a aluna, por causa do telemóvel?

Essa vergonha agravou-se por ter sido filmada e posta a circular nas redes sociais. Descubro um livro de Jon Ronson, So You Have Been Publicly Shamed, e tomo consciência da medida em que as redes sociais se tornaram lugares de humilhação pública. Um deslize no Facebook, um comentário mal interpretado no Tweeter, uma frase politicamente incorrecta, que nem tinha, porventura, a intenção atribuída e depois amplificada, e o coro de abutres cai sobre um desgraçado.

Nem imaginamos, por aqui, as consequências de um erro ideológico, ou de sensibilidade, nesses meios. Temos apenas uma vaga ideia, por muito que nos irritem certos comentários a um tweet nosso; por muito que nos surpreendamos com a estupidez dos luso-haters; por muito que abominemos a cretinice dos defensores portugueses de causas sagradas, que não compreenderam a ironia. Mas, acreditem, isso nada é. Nada, ao lado dos EUA, onde pessoas populares, que eram consideradas belas, boas, bem-sucedidas, e eram idolatradas e imitadas, tombam de pedestais, perdem amigos e o emprego, e são ostracizadas para sempre.

Há-de chegar-nos a vez. Em Portugal somos demorados, mas atentos. Para a imbecilidade vingar, precisa apenas de tempo.

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