quarta-feira, 30 de agosto de 2017

O TRABALHO


Todos nós, seres humanos vivendo em sociedade, obrigados a trabalhar para o próprio sustento, aprendemos a sentir o esforço do nosso trabalho como penoso e desgastante, uma forma, que aceitamos (que remédio!), de opressão, um peso que mina e condiciona o sentido da nossa existência e o valor da nossa vida.

É verdade que, não há muitos séculos, o ingresso das mulheres no mundo laboral foi saudado pelo pensamento feminista como um passo para a emancipação. Igualmente, a entrada de um jovem no seu 1° emprego é vista como a garantia da sua independência. Finalmente, sabemos que a pessoa que se reforma está ansiosa por se dedicar a actividades em que se realize — ou seja, em redescobrir o trabalho de um modo que o faça sentir-se vivo e feliz.

Parece um pouco retrógrado sacar, hoje, qualquer referência a Marx. Pensadores do século XXI, imbuídos do espírito científico e de um festival de experiências, não se dignam já falar do velho barbudo, sequer para o denegrir. As contas foram saldadas. A História se encarregou de mostrar em que resulta a aplicação da teoria marxista à prática. Assunto arrumado.

E todavia, as palavras de Marx acerca do trabalho (que já, antes dele, eram as de Hegel) são de uma sagacidade filosófica que o tempo não arruinou. O trabalho preenche-nos. O poder de realização de coisas é o princípio da nossa própria realização, como sujeitos e seres humanos. Sermos capazes de ensinar, de consertar, de pintar ou dançar, ou representar ou cozinhar, de coser ou dirigir, ajardinar, experimentar, narrar, limpar ou tocar um instrumento, constitui, em todas as formas, aquilo sem que a vida seria mais pobre e mais triste.

É, portanto, quando não nos realizamos no trabalho porque este nos nega, deixando-nos com o travo da infelicidade mais do que do bem-estar, quando "não desenvolve livremente as energias físicas e mentais, mas se torna fisicamente exaustivo e mentalmente desgastante", não escolhido nem desejado, antes imposto, que ele se vira contra nós, ao invés de nos libertar.

A isto, Hegel, primeiro, Marx e Engels, no século XIX, chamaram alienação. A cisão, de cada um, de si mesmo. Não sermos nem nos reconhecermos no que fazemos. Roubarem-nos de nós a nós mesmos, empurrando-nos para uma rotina absurda.

Ao contrário do que poderíamos pensar, nem sempre a compreensão do que sucede está nas últimas descobertas. Às vezes, basta relermos os pensadores de ontem.

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